As vezes me parece que algumas coisas que certos indivíduos fizeram no passado pareceram ser tão boas,tão originais que hoje, nós usamos estas idéias ou ações da mesma forma, independente de todo o contexto socio-cultural emergente. Se tratando de música isto fica muito aparente. No caso da música clássica, já perdi a conta de quantos compositores a partir de um determinado momento de suas carreiras voltaram a compor obras baseados em moldes e sons do passado. Será isso apenas um modo de se acomodar? Um modo de repensar sua estética? Apenas saudosismo? Não temos como saber. O certo é que este estilo de música esta profundamente enraizado no passado, todo jovem compositor basicamente esta andando na sombra de gigantes que de uma forma ou outra ainda mantém uma influência esmagadora o onipresente sobre todos eles.
Casos famosos de compositores que fizeram a transição vanguarda-classicismo, incluem o do polonês Krzysztof Penderecki e do finlandês Magnus Lindberg. Enquanto que para o primeiro esta transição parecia ser o único caminho de continuar seguindo em frente (basta ouvir qualquer uma de suas obras do começo da carreira, elas literalmente redefinem o que é possível fazer com uma orquestra), além de suas constantes reclamacões em relação a falta de novos instrumentos, o caso de Lindberg pareceu ser uma crise estética. As obras de sua juventude composicional incluem dentre outras, "Kraft","UR", "Action-Situation-Signification", todas elevando os níveis de brutalidade e abstração nunca antes vistos no mundo da música clássica,"Kraft" em especial por contar percussão feita a partir de ferro-velho e acorde de mais de 70 notas. A partir dali como aconteceu com Penderecki se tornou difícil continuar compondo (mesmo que no caso de Lindberg, diferente do de Penderecki, ele possui-se a seu alcance toda uma nova tecnologia de computadores e processadores de som que ele usou no começo de sua carreira). Inspirado em seus conterrâneos Jean Sibelius e Einojuhani Rautavaara, adotou um estilo mais amplo, que explorasse todos os aspectos da música que incluem a harmonia e a melodia, duas coisas que praticamente não existiam em sua música.
O caso do rock sempre me pareceu ser mais decepcionante (não que os casos citados acima seja ruins, a música de ambos continua muito interessante e sincera a meus olhos). Diariamente somos bombardeados com novas bandas e artistas cuja música é apenas um pastiche de tendências passageiras+atitudes "rebeldes", cujo único objetivo e faturar em cima de jovens alienados e sem uma consciência profunda de sua existência mundana. Claro que existem grupos que vão contra estas tendências "modernas", mas grande parte deles comete o erro de se espelhar muito no que eu havia dito no primeiro parágrafo, os moldes do passado. Não que isso seja algo péssimo, o passado é uma grande fonte de inspiração, educação para qualquer um, além de ter moldado o que tudo é hoje, mas tentar usa-lo descaradamente sempre me pareceu estúpido.
O som de próprio rock também sempre foi convidativo a várias pessoas sem talento ou idéias individuais se aventurarem por ele de forma descarada. Os dogmas do estilo geraram toda uma geração de músicos que "acham" que o rock só pode ser feito de um jeito e todos os outros são errados, ao mesmo tempo que uma nova safra tenta acabar com todo isso, porém falhando miseravelmente ao não possuírem todo um background cultural além do pleno entendimento do que realmente estão fazendo. Um dos poucos grupos que ao meu ver sempre pareceu não se encaixar em nenhum dos movimentos citados acima (elemento chave para mim),e ao mesmo tempo combinar perfeitamente os dois(passado+futuro) foi o suiço Young Gods (foto).
Descrito por alguns como a primeira banda do século XXI, o YG seguiu um caminho ao mesmo tempo iconoclasta e reverencial aos mestres do passado. Ao abolir de vez as guitarras (símbolo máximo do rock) e optar por sons pré-gravados (e devidamente alterados eletronicamente) combinados com ritmos ensandecidos e vocais as vezes operáticos, as vezes diabólicos, em francês, além de toda uma estética centro-europeia, o Young Gods redefiniu o que é preciso para tocar rock puro e animalesco. Além de se aventurarem em projetos de música concreta/ambiente combinadas com projeções hi-tech, o grupo já prestou mais de uma vez homenagens aos grandes mestres. A primeira ao lançar um disco contendo interpretações do compositor alemão Kurt Weill, a segunda vez ao embarcar em um concerto multi-midia que combinava imagens restauradas de Woodstock e o grupo tocando versões emblemáticas das canções executandas no festival.
Uma banda que ao mesmo tempo desafia rótulos e consegue criar dor de cabeça tanto nos adeptos da velha guarda, quanto na nova geração, só poderia amargurar na rua da solidão, mas o grupo até hoje se mantém referência para músicos de mente aberta e de gostos amplo, apesar de ainda ser uma banda "cult".
Independente de qualquer coisa a evolução deve ao mesmo tempo sempre olhar para os dois lados, o futuro é como a morte, pode parecer terrível e sombrio mas é inevitável e devemos abraça-lo, ao mesmo tempo que o olhamos com toda a compreensão que temos da história até aquele ponto, por que ao ignorar o inevitável ou o que nos moldou como somos, revelamos uma grande ignorância da nossa parte. Toda a geração possui problemas que só serão resolvidas pelos próprios. Não podemos nos iludir que os do passado foram mais fáceis de serem resolvidos porque as respostas pareciam óbvias, devemos enxergar tudo por uma ótica mais abrangente e aceitável a erros, porque só com eles temos a compreensão.