De uns tempos para cá, reparei que a coisa mais difícil na música é trabalhar limitando-se a um instrumento solo. Obviamente que baseando suas fontes sonoras em um único instrumento o indivíduo é obrigado a ser criativo, pensar além das óbvias capacidades do referido instrumento, tentar superar limitações técnicas, e o músico deve fazer o que o poeta Garcia Lorca declarou certa vez (obviamente esta frase se refere a poetas, mas cabe muito bem aqui nesta situação):"[...] ir a caçada limpo e sereno, disfarçado até. Manter-se firme contra as miragens a vigiará cautelosamente as carnes palpitantes e reais que se conciliam com o plano [...] que tem em mente".
Apesar das grandes dificuldades de se trabalhar assim, existe algo que apenas um instrumento solo pode revelar ao ouvinte: a verdadeira face do autor. É quase que como se ele estivesse ali, ao seu lado, sussurrando em seus ouvidos coisas que ele nunca poderia revelar ao mundo por meio da linguagem falada, sensações e sentimentos que só podem ser descritos como abstratos e de difícil associação com o mundo real. É possível saber muito mais de uma pessoa analisando ela apenas por sua arte, pra mim o grande trunfo desse meio. A natureza humana é revelado de uma forma nua e crua, mesmo que ela seja para um consenso geral, impenetrável e terrível. De todos estes artistas que conheço provavelmente poucos conseguiram se mostrar ao mundo como o catalão Federico Mompou (1893-1987).
Mompou passou grande parte de sua longeva vida dedicando-se ao piano, para qual compôs inúmeras peças. São obras semelhantes a pequenas miniaturas, convidativas a inúmeras interpretações e extremamente intimas em sua natureza. Comentando certa vez sobre suas obras agrupadas sobre o nome "Musica callada", mompou declarou: "[...] esta música não possui ar nem luz. É uma fraca batida de coração, você não pode pedir que alcance mais que algumas polegadas no espaço, mas sua missão é alcançar as profundezas de nossa alma e as regiões secretas de nosso espirito. Esta música é calada porque você ouve junto com ela. Contido e reservado[...]".
O gosta pelas miniaturas, além da influência catalã,se deve ao contato com a música do compositor francês Erik Satie (1866-1925). Após se aprofundar em sua música, Mompou teve o que ele mesmo chamou de um "recomeço", ou seja um retorno a expressão primitiva, pura e clara da natureza humana pelos meios mais simples e diretos. Alguns aspectos técnicos de Satie também foram agregados em seu estilo, como o abandono de armaduras e das divisões de compasso em suas partituras, para deixa-las livres de compromisso com tonalidades, e que o musico que deseja-se executa-las não apenas "tocasse" mas as "interpretasse" segundo seu gosto.
Vivendo em um mundo onde tudo parece estar cada vez mais bombástico e exagerado, a busca por uma expressão verdadeiramente fiel de um artista esta cada vez mais difícil, e normalmente quando a achamos, vemos que não passa de algo diluído e puramente superficial. Um artista como Mompou que conseguiu por meio de sua própria visão da música,do mundo e do ser humano, elaborar algo ao mesmo tempo tão simples, porém tão complexo em suas idiossincrasias, deveria gozar de um prestigio grande em seu meio, mas como o mundo não é perfeito, sua arte é conhecida e admirada por poucos.
(Para todos aqueles que querem se aprofundar neste grande músico, sugiro que procurem pela série "Mompou Plays Mompou" são 5 volumes que tem próprio interpretando suas obras para piano de forma magistral e muito bem gravado, um verdadeiro achado artístico.)
procurarei o senhor Federico!
ResponderExcluirps.: usou minha palavra favorita!